Folhetim

Em volta do romance a prestação, a Entrelivros publicou matéria interessante acerca dos folhetins:

"O romance-folhetim surgiu no século XIX, no rodapé das páginas de jornal, com um pontilhado indicando a linha para ser recortada. Obras de autores como Balzac, Flaubert e Victor Hugo foram assim apresentadas para seus leitores: em capítulos. Criado na França, o formato foi uma forma de facilitar o acesso ao livro. Na década de 1830, o modelo foi importado pelo Brasil, primeiro traduzindo os franceses, depois publicando autores como Teixeira e Sousa, Joaquim Manuel de Macedo, depois José de Alencar e Machado de Assis, chegando a Nelson Rodrigues e Orígenes Lessa.

Mas essa prosa em capítulos, extremamente popular em fins do século XIX, foi gradualmente sendo esquecida. No livro Os romances em folhetins no Brasil (1830 à atualidade), José Ramos Tinhorão faz o primeiro levantamento dos folhetins publicados de 1830 a 1994. Numericamente, pode-se ter uma idéia desse decréscimo: de 1839 a 1900, foram lançados 198 folhetins. De 1950 a 1994, apenas 36."

Cita, ainda, o jornal literário curitibano Rascunho, que resolveu recuperar o romance-folhetim em 2005 e publicou capítulos de O inglês do cemitério dos ingleses, do escritor Fernando Monteiro.

Muitos escritores brasileiros têm publicado seus romances assim, ultimamente: em folhetim e depois em papel, ou vice-versa. 

Sonia Regina



Midas - Sonia Regina 


 [capitulo 21]





























Deixar-se cair, da borda, na estrada.

Não sem espanto, continuei a ler a escritura de Midas.
Do sétimo ao décimo capítulo Midas falava dos caminhos vários pelos quais certamente havia passado, apreendendo-lhes os sentidos.
Expunha com sabedoria, embora de maneira extremamente simbólica - o que não me cansava em absoluto.
Dediquei-me a viajar por eles.

7- ÇARKARA [1] , O CAMINHO DE AREIA

Conheci Çarkara numa quebra do caminho do mundo, sem que a urgência esgotasse as palavras, sem que os versos estivessem criando a ilusão do eterno. A maré encontrava a areia e, nas fronteiras, era a certeza do sol a única opção do tempo. Sem pegadas ou sinais de maresia, o futuro era gerado apenas de um sorriso.


8- AO LONGO DO RECIFE DE CORAL
Um sol febril iluminava a borda do areal e via-se o caminho novo. A sede sorvera a água da costa, mas tudo avançava a bom ritmo ao longo do recife de coral. O Verbo soprava a alma como nos primórdios e o milagre da imagem cintilava no verso. Quando a noite se despedia das estrelas do mar e mergulhava nas águas azul-escuras do oceano, o gesto escrevia a manhã.


9- ATMAN [2] , O CAMINHO D’ALMA

Não contabilizo os momentos que tornam a noite escassa: são ensaios. Doravante, o caminho será cada vez mais difícil. Assisto os instantes minguarem e improviso no mundo visível. Como um jazz furioso defendo, neste meu rio, o caminho. Pedra a pedra apóia-me o mito e o deus sem máscaras veste-me de alegria, a glória de viver a ungir-nos o sexo. Conheço o segredo dos rios vermelhos e quentes. No lugar do sangue giram os corpos que, entre brados e gemidos, são conduzidos ao seu fim marítimo.


10- CAMINHADA SOLAR

O tempo, incerto instrumento de precisão da vida, pouco lhe adiantara. Entretanto, reconhecia-se no arrepio cortante do frio. Primeiro as mãos, depois os cabelos. Jamais se vira amar com tanta alma e rigor, o que deixou-o à mercê da devastação. O salto já tinha acabado há pouco, voara da leitura à escrita, urgia despir-se dos pássaros e pôr-se a andar. Com confiança, sem metafísica ou idéias brandas. Exploradas as possibilidades, era hora de deixar-se cair, da borda, na estrada. Iniciamos juntos a caminhada, e proclamamos versos ao sol.


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[1] No Sânscrito, çarkara quer dizer grãos de areia, palavra da qual deriva assukar (Açúcar) [2] "O caminho eterno" (em Sânscrito, " Sanātana Dharma" ), ou a "Filosofia perene/Harmonia/Fé", é o nome que tem sido usado para representar o hinduísmo desde a antiguidade. De acordo com os hindus, transmite a idéia de que certos princípios espirituais são intrinsecamente verdadeiros e eternos, transcendendo as acções humanas, representando uma ciência pura da consciência. Mas essa consciência não é meramente aquela do corpo, da mente ou do intelecto, mas a de um estado de espírito supramental que existe dentro e além de nossa existência, o imaculado Ser de tudo. (...) Entre os princípios fundamentais incluem-se ainda o ahimsa (não-violência), com a primazia do Guru, a palavra divina Aum e o poder do mantra, amor à verdade em muitas manifestações como Deus e Deusas, e a compreensão de que a chama divina essencial (Atman/Brahman) está presente em cada ser humano e em todas as criaturas viventes, que podem chegar por diversas sendas à Verdade Una.” - Jhen



Imagem: Clive Mealey

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